quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Sobre animais, família e a vida



O jornalista John Grogan, autor de Marley & Eu, é também o responsável pelas crônicas publicadas em Cachorros encrenqueiros se divertem mais. Este, uma coletânea de textos veiculados em sua coluna no jornal The Philadelphia Inquirier. Animais, família e lições da vida compõem a temática do livro, com publicações curtas selecionadas entre 2003 e 2006.

John Grogan (Foto: Fresh Fiction)
Com escrita fluida, Grogan discorre sobre fatos pessoais marcantes, curiosidades e lições, tendo o subúrbio da Filadélfia como pano de fundo. Podemos conhecer a relação de pessoas com seus animais, comportamentos e decisões exemplares, infortúnios cotidianos, lições de vida e críticas sociais. Uma leitura rápida, diversificada e interessante. 

Entendi porque os gansos do Canadá não migram no inverno, como o serviço de aeroporto na Filadélfia é horrível, a luta de uma garotinha de cinco anos contra o câncer, dicas contra o telemarketing e como a AOL pode ser inconveniente enviado CDs de testes por correspondência à quem não deseja. 

Apesar de qualificar o livro como bom, mesmo ignorando os erros de edição, ele não é uma daquelas obras que mudam nossa vida e deixam uma grande mensagem. É uma leitura que pode ser prazerosa e... só isso mesmo. Vale a pena de forma despretensiosa. Foi um "livro-carona", onde o jornal viu o momentâneo sucesso do autor com o best-seller e tentou tirar proveito disso. Não foi uma decisão errada. Nota 7.



domingo, 22 de fevereiro de 2015

Desafio Livrada! 2015

Como muitos dos blogs e vlogs que acompanhamos estão participando do Desafio Livrada! 2015, resolvi participar também. Na verdade, eu e o Ramon estamos com um outro desafio, que é de não comprar nenhum livro até o dia dos namorados. Começamos em dezembro do ano passado e vamos ficar seis meses sem comprar nada, um baita desafio para quem é leitor, né? Então estamos aproveitando esse período para dar desovar os livros de nossas estantes, que está cheia de oportunidades!

Portanto, para esse desafio, estou também tentando utilizar ao máximo os livros que tenho na minha estante e alguns emprestados do Ramon. Alguns que eu li no início desse ano já estão valendo, por se encaixarem em alguma categoria. Deixarei o link respectivo aqui embaixo, vamos lá:

1- Um livro policial: O cachorro amarelo - Simenon
Esse é um dos três livros que ainda não tenho, portanto só irei ler depois de junho. Ainda não li nenhum livro dele e estou muito curiosa, resolvi colocá-lo no desafio.

2- Um livro infantojuvenil: O Mundo de Sofia - Jostein Gaarder
Não tenho muito interesse em livros infantojuvenis, até porque o único livro desta categoria que li nos últimos anos foi uma grande decepção: O Fazedor de Velhos, de Rodrigo Lacerda. Então resolvi pegar um clássico que ouvi falar muito e de um autor que escreveu um dos melhores livros que li em minha adolescência, O dia do curinga.

3- Um livro de ficção científica: A mão esquerda da escuridão - Ursula le Guin
Comecei a ler ficção científica no ano passado, com Andróides sonham com ovelhas elétricas?, de Philip K. Dick e adorei. Comprei o livro da Ursula le Guin no ano passado e já estava muito a fim de ler, então entrou para o desafio.

4- Um livro escrito antes do século XX: Decameron – Boccacio
Essa categoria foi muito fácil, tenho vários livros escritos antes do século XX na minha estante e vários deles pretendo ler ainda este ano, escolhi Decameron pois já li e é um livro muito interessante. Em breve farei uma resenha no blog sobre ele.

5- Um livro de ensaios, artigos ou crítica literária: Seis passeios pelos bosques da ficção - Umberto Eco
Esse com certeza é o maior desafio da lista para mim, não leio crítica literária, no máximo alguns artigos que vêm em edições caprichadas, principalmente da Cosac Naify. Mas como não seria desafio se fosse tudo fácil, escolhi esse do Umberto Eco que o Ramon me indicou e já tinha em sua estante.

6- Um livro que você já está querendo ler há mais de dois anos: Jakob Von Gunten - Robert Walser
Outra categoria muito fácil, tenho dezenas de livros que comprei há mais de dois anos e quero ler, escolhi esse do Walser pois já ouvi falar muito bem do autor.

7- Um romance com protagonista feminino: Viva a Música! - Andrés Caicedo
Esse é outro livro que vou ter que comprar, mesmo tendo livros com protagonistas femininos na minha estante. Depois de ler algumas críticas sobre ele, fiquei muito interessada, principalmente por ser o oposto de seu conterrâneo Gabo, além de ter ficado tantos anos desconhecido para o leitor brasileiro, depois de junho começo a leitura.

8- Um romance africano: A varanda de frangipani - Mia Couto
Adoro literatura africana, e Mia Couto está entre meus autores preferidos. Tem vários outros autores que gostaria de conhecer, como  Chimamanda Ngozi Adichie, Chinua Achebe e Teju Cole, mas mais uma vez tinha o livro na minha estante, então vou dar preferência para ele.

9- Uma peça de teatro: A santa Joana dos matadouros - Bertold Brecht
Outra categoria que tenho pouco costume em ler, mas os que já li gostei muito. Esse livro é o único de teatro que tinha em minha estante, então foi ele mesmo.

10- Um romance de realismo maravilhoso latino-americano: Do amor e outros demônios - Gabriel García Márquez
Livro maravilhoso que li no início do ano e por isso entrou na lista. Esse já tem resenha aqui.

11- Um livro que todo mundo diz que merece uma chance, mas você acha que não: Os Cus de Judas - António Lobo Antunes
Muita gente fala bem sobre os livros de António Lobo Antunes, e há alguns anos comprei esse livro, comecei a ler, não gostei nem um pouco e acabou abandonado na minha estante. Acabei ficando com uma má impressão dele, mas agora vou ver se essa opinião muda.

12- Uma biografia: Joseph Anton - Salman Rushdie
Outro livro muito bom que já li esse ano e tem resenha aqui.

13- Um livro reportagem: Corações Sujos - Fernando Morais
Categoria que leio pouco mas sempre gosto dos que leio, esse foi indicado pelo Ramon.

14- Um livro que virou filme: Fahrenheit 451 -  Ray Bradbury
Adoro distopias, alguns de meus livros preferidos são 1984, de George Orwell e Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, então quando vi que o livro do Bradbury já tinha virado filme, escolhi na hora, pois já faz tempo que gostaria de ler.

15 - Pastoral Americana: Ruído Branco - Don DeLillo
Já li Pastoral Americana, que achei (beijinho na ponta dos dedos) uma bosta - Kkkk. Então resolvi ler o do Don DeLillo, que é um autor que gostaria de começar a ler, apesar de ter um ranço com os escritores americanos atuais.

Bem, é isso, espero completar esse desafio. Se você gostou e quiser participar também, comente aqui embaixo os livros que quer ler e vá na página do Livrada para conhecer!

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Sem a letra "O"

A seguir, replicarei o texto Reminiscência do Ziraldo, extraído do livro "Crônicas Mineiras", Editora Ática - São Paulo, 1984, pág. 109. Uma ótima reflexão sobre a infância, a saudade e as coisas simples da vida, tendo Minas como pano de fundo.

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Nasci numa pequena cidade de Minas. Até aí nada demais. Muita gente nasce em cidades pequenas, distantes e quietas. Seria feliz, de qualquer maneira, se quem lê neste instante pudesse saber a alegria que existe em se nascer num lugar assim, em que as ruas pequenas e estreitas, as altas palmeiras, a água macia da chuva que cai sempre, as muitas estrelas e a lua, as pedrinhas das calçadas, a meninada, a carteira da sala de aula, a mestra e mais uma quantidade destas lembranças simples sejam, mais tarde, influências reais na vida da gente. Na vida de quem, afinal, preferiu enfrentar a cidade grande: as águas desse mar, a luz dessas lâmpadas frias, a sala fechada, triste e sem perspectivas em que se ganha a vida, a cadeira quente e insegura das tardes de ir e vir — pura fadiga — das empresas, a luta, a dura luta de ser alguém, um peixe grande em mar estranhamente grande. A verdade é que, um dia, a pensar e refletir na grama macia da pracinha da matriz, a criança decidiu sair.

E a estrada se abriu a sua frente. Vir era uma idéia. Fixa. Caminhar era fácil.

A chegada: a rua imensa, as buzinas, as luzes, sinal verde, aquela cidade grande, grande ali, na sua frente. Cada face, cada ser que passava — pra lá e pra cá — inquietamente, tanta gente, suada, apressada, sem alegria, sem alma, a alma cerrada, enrustida, cada triste surpresa era a chegada.

Cheguei. Um táxi. A mala. As esquinas. Está bem, mas, que fazer? Sentei e pensei. Pela janela da casa alta vai a vida. Seria a vida? E disse a primeira frase na cidade grande, as primeiras palavras diante da grande luta e as palavras eram: Meu Deus, que saudade! E nem um dia me separava da pracinha da matriz. Cada dia que, a seguir, vi passar, esqueci.

Diante da máquina, neste instante, há uma distância imensa entre aquele dia na missa cantada na minha igrejinha e este dia em que, diante de mim, diante de minha mulher e da minha casa feita de cidade grande, minhas filhas brincam de ser gente grande.

E elas. Que vai ser delas? Sem palmeiras, sem um pai de ar grave; sem entender a chuva a cair em jardins humildes, nas margaridas branquinhas; sem entender de lua e de estrelas — que céu aqui, pra se ver nem se vê —, sem brincar na lama das ruas, a lama das chuvas, casca de palmeira, descer as barracas, nadar sem mamãe saber, nas águas escuras, fim de quintal, quintal, quintal? sem quintal? pedrinha de calçada, marcar a canivete sua inicial na carteira da sala. Ainda bem que nasceram meninas.

Já é diferente. Será que é? Sei lá. Entre a chegada e este instante, lembrança nenhuma. Sei que cheguei.

E sei mais: que esta página está é uma grande besteira, dura de cintura, sem graça, uma m... Já se vê que quem nasceu para caratinguense nunca chega a Rubem Braga. E também tem mais: Quem é capaz de escrever uma página literária decente — igual a essa (?) — sem usar uma vez sequer a letra O? Leiam mais uma vez. Atentamente. Se tiver um — além deste aí em cima — eu como!

Sobre Ziraldo Alves Pinto
Ziraldo (Foto: Blog historiando)
Nasceu em Caratinga (MG), em 1932. É um homem de múltiplas atividades: advogado, jornalista, desenhista de humor, escritor infantil, autor teatral e de cinema, empresário, confirmando o que disse em uma entrevista há muito tempo: "Eu quero é abraçar o mundo com as pernas". Um dos fundadores do jornal "O Pasquim", que fez grande sucesso nos anos da repressão, lançou a revista "BUNDAS", em 1999, que só durou alguns meses. Em 19-02-2002, sob sua liderança, "O Pasquim" voltou às bancas, numa tentativa de fazer renascer o velho sucesso. Criador de Flicts, Jeremias, o Bom, O Menino Maluquinho, O Mineirinho Come-Quieto e tantos outros mais, que fazem parte de nosso cotidiano, aqui o autor é apresentado de forma intimista e emocionada, contando, sempre com muito humor, sua saída de Minas.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Um retrato da Segunda Guerra em quadrinhos



MAUS apresenta a história verídica do pai judeu do quadrinista Art Spiegelman, por meio de suas lembranças do período vivido em Auschwitz. O diferencial do livro fica por conta da metáfora escolhida para representação dos personagens. Os judeus são ratos, os alemães nazistas são gatos, os poloneses são porcos e os americanos são cães.

Trecho do livro
É possível compreender, acompanhando os relatos do velho judeu, as transformações ocorridas na vida das pessoas na época da Guerra, o grande impacto das decisões de Hitler e, principalmente, as precárias condições de subsistência impostas aos judeus. Até a extrema avareza do contador da história tem sua base nas tristes experiências vividas. De repente todas as riquezas e posses foram tomadas, eles passar a ser tidos como lixo e têm que se esconder em bunkers (câmara improvisada e isolada, onde os judeus ficavam dias sem poder sair, sem ter o que comer ou beber), até sua descoberta pelos soldados, o trabalho forçado, a fome, a humilhação e a morte. Primeiro crianças e idosos são sacrificados, depois tantos colegas de trabalho.

O livro consegue mostrar a história pesada e sangrenta de uma forma clara e simples. Temos uma visão do confronto segundo um judeu. Ficamos revoltados, incomodados e incrédulos. 

A história é contada nas visitas que Art faz a seu pai, já muito debilitado. Após o fim da Guerra, a mãe do quadrinista, devido às perturbações vividas, comete suicídio, deixando o marido sozinho e amargurado. Enquanto a relação entre pai e filho se estreita um pouco, o período de vida do pai se encurta, mas não finda até acabarem os seus relatos. Uma excelente dica para fãs de quadrinhos e para os que gostam de compreender detalhes da história mundial. Nota 9.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Um convite à reflexão com um toque de saudade



Por Júlia Martins

O último projeto de José Saramago é uma incursão ao mundo da produção bélica. As poucas páginas escritas que deixou já nos mostram o tom de crítica que faria neste livro, nos remetendo a tantos outros do autor. Além disso, ele se preocupa em criar uma relação bem humana entre seus personagens e trabalha um tema recorrente em seus livros, a burocracia. Por esse motivo me lembrei muito de seu romance Todos os nomes quando comecei a leitura.

José Saramago faleceu em 18 de junho de 2010 (Foto: Veja)
Alabardas, Alabardas é um livro triste. Uma história sem desfecho é sempre triste ou irritante, mas sabendo que aquele narrador querido nunca mais estará ali, que não finalizará aquele ou qualquer outro livro, nos deixa em um estado melancólico.

A verdade é que algumas pessoas não deveriam ter o direito de morrer nunca, incluindo nossos autores preferidos. José Saramago é o principal escritor que me sugou para o mundo da literatura após adulta, juntamente com Ítalo Calvino. Quando soube de sua morte, fiquei desconsolada - escrevi até um miniconto - e após terminar esse livro tive a mesma sensação.

Para aqueles que são fãs do autor português Alabardas, Alabardas é a leitura certa e deverá completar a coleção das obras de Saramago iniciada por Claraboia, seu primeiro livro. Para pessoas que não conhecem a obra do autor, existem diversos outros livros, completos, que são mais interessantes e que irão arrebatar aqueles que tiverem a paciência de enfrentar um livro sem muita pontuação e travessão nos diálogos. Eu digo, pela minha experiência, que Saramago sempre é uma leitura muito prazerosa.

O que seria uma alabarda? 
Alabarda (Foto: RuneScape Second)

Significado de alabarda, segundo o portal InfoEscola: uma arma medieval formada por uma haste comprida de madeira, terminada em um espigão de ferro atravessado por uma lâmina também de ferro, em formato de meia-lua, com um esporão do lado oposto. A alabarda é incluída na categoria de armas de cabo longo, que se tornaram mais conhecidas a partir do século XVI.




segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Entre demônios e amores



Por Júlia Martins

Nós somos tragados para o universo fantástico de Gabriel García Márquez sem perceber. São nos detalhes do romance que ele começa a construir o universo tão conhecido do autor, como um cavalo que vive cem anos, ou uma personagem que sofre de flatulências graves, causada por ter comido cacau e mel em excesso. Por isso, os mundos criados por Gabo não são completamente malucos como muitos acreditam, mas uma realidade próxima enlaçada em mistério, na qual ficamos sempre com uma sensação de deslocamento.

Nesse ambiente que se desenvolve a lindíssima história de Do amor e outros demônios. A protagonista é Sierva Maria, uma menina renegada pelos pais e que acaba sendo criada pelos escravos da família, numa pequena cidade da Colômbia, ainda na época colonial. Logo nas primeiras páginas da história, Sierva é atacada por um cão raivoso que contagia todos os que são mordidos por ele, menos ela. Porém, certo dia a menina fica com febre e então todos têm a certeza de que ela foi acometida pela doença.

Sierva Maria em filme homônimo (Fonte: Rotten Tomatoes)
Seu pai então, numa tentativa de se redimir da apatia que sempre teve pela filha, e apesar de não ser nada religioso, muito pelo contrário, resolve entregar a menina a um convento próximo, Santa Clara, para ela poder, ao menos, ter os devidos cuidados da alma antes de morrer. Nesse ambiente, tendo tido toda sua formação dada por escravos, utilizando diversos ornamentos dos negros e falando muitas línguas africanas, rapidamente as freiras começam a acreditar que Sierva Maria está na verdade possuída pelo demônio.

E é nesse momento, diante de seus recém descobertos demônios internos, além dos vários que circundam a atmosfera do convento, que a menina conhece Cayetano Delaura, padre designado para realizar seu exorcismo. Esse encontro muda para sempre o destino dos dois personagens.

Gabo faleceu em 17 de abril de 2014 (Fonte: Huffington Post)
Do amor e outros demônios é um dos livros mais bonitos que li recentemente e altamente recomendável para quem quer conhecer a obra de Gabo, pois é uma obra curta, fácil e já traz todo o universo fantástico e a força narrativa do autor colombiano. É um livro que, essencialmente, fala de amor. O embate entre a fé e o amor, tem o último como vitorioso, reforçado pela fala de um dos personagens: “sempre acreditei que Ele leva em conta mais o amor do que a fé”.