quarta-feira, 25 de novembro de 2015

O amargor do tomate


Vermelho amargo, de Bartolomeu Campos de Queirós, é uma prosa poética de cunho autobiográfico. A narração é feita por um menino que mostra como ele e os irmãos encaram a morte da mãe. Eram seis irmãos, dois já morreram no momento em que o romance é relatado. Cada um dos sobreviventes encontrou uma maneira de encarar a vida sem a mãe: o narrador sobrevive os dias com seu silêncio e seu amor interno, vivido sem transparecer. Enquanto a irmã mais velha se dedica à costura em ponto-cruz; um irmão come vidro, isso o alivia. Outro não fala, mia, e é inseparável de gato, mudo. A irmã mais nova, que veio ao mundo enquanto a mãe partia, encontrava paz no globo, objeto no qual a cada dia ela escolhia um lugar diferente para acordar, em sua imaginação.

O pai se entregou ao álcool e recomeçou a vida ao lado da madrasta. Enquanto a mãe era doce, a madrasta era amarga. Sua fúria era descontada no tomate, servido em cada refeição diária, carregado de amargor. O legume sempre foi a estrela do prato. Como uma metáfora, todos comiam o tomate indigesto, como maneira de aceitar a vida imposta pelo destino.

Pouco a pouco, cada um dos irmãos deixa a casa, a seu tempo. Esse fato é apresentado ao longo do romance como contagem regressiva, enfatizando cada despedida. É com pesar que o narrador vê a casa ficar cada vez mais vazia, enquanto as fatias do tomate ficam mais grossas. Isso perpetua até o momento de sua própria partida. O menino passa a não acreditar em Deus. Somente os livros e sua fantasia o mantém fora da realidade amarga.

Um livro curto (72 páginas), mas grande em aspectos literários e sentimentos. Nos vemos imersos na vida do menino e padecendo de suas angústias. No final, não queremos, nem estamos preparados para que o livro acabe. Ficamos com o gosto amargo do tomate na boca e o mal-estar indigesto provocado por ele. Nota 9. A edição da Cosac tem letras vermelhas enfatizando essa presença, amarga, do tomate.

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